Pensando um Segundo...

... é lógico que gostaria muito de reverter muitos traços de autismo no meu filho, pois almejo sua felicidade e independência, mas não tenho mais aquela angústia abafada no peito, desesperada por uma cura como se ele fosse um brinquedo com estragos e que eu queria a todo custo consertar. Hoje sou muito Feliz com o SEGUNDO de hoje. Curto cada momento de alegria dele , cada palavra nova, cada pequena descoberta . Acho ele tão doce... ( e marrento também, às vezes). Pelas palavras, na maioria das vezes, faltarem, ele substitui muito por gestos ou puxando minha mão para pegar o que ele quer, mas amo quando ele assiste um comercial ou ver escrito e diz: Mais Você ou “caderão do uqi”, “jorná nacioná”, armazém papaíba ou ainda quando pergunto o nome dele, da irmã, do pai e o meu(é claro) e ele responde rapidinho. E o melhor é perguntar como ele está e ele dizer: “estou apaxonado”. Se ele tem consciência do que fala? Não sei.... Só sei que o amo por tudo que faz e por aquelas que não consegue fazer. Tento não perde nada... nadinha da vida dele, pois, na vida, ele é meu professor.

Enfim como diz Dalai Lama : '' a felicidade é saber curtir o caminho e não só almejar a chegada. "

Abraços

Vilma Candido



sábado, janeiro 5

Os vetos referentes ao direito à educação das pessoas com TEA na Lei 12.764/12



Como já mencionei no post sobre a principal importância da Lei 12.764/12, temos que comemorar (e muito) sua sanção, mas, por outro lado, não há como não comentar  (e até lamentar) sobre os vetos da Lei que tinham sua importância e deveriam ter sido mantidos quando de sua sanção.

Dedicarei este post a dois dos dispositivos vetados, que referem-se ao direito à educação e, por esta razão, os analisarei conjuntamente.

Constam como fundamentos do veto desses dispositivos, conforme publicação no Diário Oficial da União, que “ao reconhecer a possibilidade de exclusão de estudantes com transtorno do espectro autista da rede regular de ensino, os dispositivos contrariam a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, internalizada no direito brasileiro com status de emenda constitucional. Ademais, as propostas não se coadunam com as diretrizes que orientam as ações do poder público em busca de um sistema educacional inclusivo, com atendimento educacional especializado nas formas complementar e suplementar.”

Bom, para verificar se há a contrariedade como afirmada precisamos conhecer o texto de ambos os dispositivos e depois fazer uma análise com base na Constituição e na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

A Convenção, como vimos, ingressou no nosso ordenamento jurídico como norma constitucional, já que aprovada conforme procedimento previsto na Constituição Federal.

E do que trata o inciso IV do artigo 2 da Lei 12.764/12 que foi vetado?

O  inciso IV do artigo 2 trazia como uma das diretrizes da Política Nacional de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA)  ”a inclusão dos estudantes com transtorno do espectro autista nas classes comuns de ensino regular e a garantia de atendimento educacional especializado gratuito a esses educandos, quando apresentarem necessidades especiais e sempre que, em função de condições específicas, não for possível a sua inserção nas classes comuns de ensino regular, observado o disposto no Capítulo V (Da Educação Especial) do Título V da Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional)“

A leitura do dispositivo legal, sob meu ponto de vista, leva a uma primeira conclusão, que como REGRA os estudantes com TEA seriam incluídos em salas regulares.

O dispositivo, porém,  previa uma EXCEÇÃO, considerando as necessidades especiais e condições específicas do aluno com TEA, que era a garantia de atendimento educacional especializado quando não fosse possível a inserção em classes comuns de ensino regular.

Entendo que este dispositivo não contraria a Constituição Federal, pois a própria Constituição prevê no inciso III do artigo 208, “a garantia ao atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino“.

Quando a Constituição fala em preferencialmente não quer dizer obrigatoriamente e, de acordo com meu entendimento, prevê como REGRA a inclusão na rede regular e como EXCEÇÃO o atendimento educacional especializado, que pode ser na rede regular ou em escolas especiais.

A dúvida, entretanto, é se este artigo da Constituição Federal teria sido revogado tacitamente quando da aprovação da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência com status de emenda constitucional e, com isso, teríamos no Brasil a adoção da inclusão em escolas regulares sem qualquer exceção.

Bom, a leitura que faço da Convenção é que não ocorreu esta revogação tácita do inciso III do artigo 208 da Constituição Federal, vigorando ainda da forma como promulgado, bem como, ainda em vigor, todas as normas dele decorrentes, no caso a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o Estatuto da Criança e Adolescente, ou seja, a regra é a inclusão na rede regular e a exceção é o atendimento educacional especializado que pode ser na rede regular ou em escolas especiais.

Sei que há vozes em sentido contrário, mas é esta a leitura que faço deste dispositivo, já que como dizemos a lei (e aqui incluo a Constituição) não contém palavras inúteis. E por que assim interpreto?

Explico.

O artigo 24 da Convenção Internacional prevê como REGRA para os Estados Partes a inclusão quando afirma que “os Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, com os seguintes objetivos: a) O pleno desenvolvimento do potencial humano e do senso de dignidade e auto-estima, além do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades fundamentais e pela diversidade humana; b) O máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos talentos e da criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas habilidades físicas e intelectuais; c) A participação efetiva das pessoas com deficiência em uma sociedade livre.”

Ainda de acordo com a Convenção “para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que: a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência; b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao ensino secundário, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem; c) Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas; d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação; e) Medidas de apoio individualizadas e efetivas sejam adotadas em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena.”

A inclusão, portanto, é a REGRA e deve ser buscada para um dia se chegar a inclusão total, mas isto não significa que não podemos ter exceções quando a pessoa com deficiência, em razão de suas necessidades especiais e condições específicas, necessitar de atendimento educacional especializado.

Aliás, obrigar todos os estudantes com TEA estudarem na rede regular que não possui um currículo adaptado, que não possui um acompanhante especializado (seja para realizar mediação nos ambientes escolares e acompanhá-lo nas atividades da vida diária), que não tem professores capacitados é violar seus direitos, em especial o próprio direito à educação, colocando inclusive a sua integridade física e vida em risco.

E não falo isso para dramatizar a situação, falo pela experiência de quem acompanha mais de 300 pessoas com TEA, cujos familiares trazem histórias de exclusão dentro da escola inclusiva da rede regular que causaram danos documentados a integridade física de estudantes.

Não sou contra a inclusão, esta é uma meta que deve ser perseguida pelo Estado Brasileiro sempre.

Mas tentar fechar as portas das escolas especiais quando não se tem escolas verdadeiramente inclusivas é praticar uma exclusão, deixando centenas de pessoas com TEA sem a possibilidade de estudar e aprender.

Ressalte-se ainda que efetivar o direito à igualdade não é tratar os iguais de forma igual, mas tratar os desiguais no limite de suas desigualdades. Este é conceito da igualdade material. Assim, não consigo imaginar que uma escola da rede regular sem adaptação para atender todos os graus de autismo possa efetivar a igualdade e garantir a inclusão do estudante com TEA. Quem sabe um dia, quando as escolas da rede regular estejam adaptadas e garantam a inclusão de todos, esta META da inclusão plena se torne real.

Sobre o parágrafo 2. do artigo 7. da Lei 12.764/12 também vetado remeto a leitura ao post que escrevi sobre o tema e acrescento, que como esclarecido acima, o referido dispositivo considerava a situação daqueles que por necessidades especiais e condições específicas não conseguiriam frequentar a escola pública regular.

Tal dispositivo criava uma exceção para não se penalizar o gestor público quando não fosse possível a inclusão na rede pública regular em razão das necessidades especiais e condições específicas do aluno com TEA.

Portanto, entendo que o inciso IV do artigo 2 e o parágrafo 2 do artigo 7, ambos da Lei 12.764/12, não violam a Constituição e a Convenção, ao contrário, estão em perfeita consonância com as referidas normas e não deveriam ter sido vetados com este fundamento.

Retirado do site: aliberdadeehazul.com

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